quarta-feira, 5 de setembro de 2007

Steppenwolf – 5/09/2007 – Vivo Rio, Rio de Janeiro

Texto: Rodrigo Werneck e Marcelo Spindola Bacha
Fotos: Pedro Paulo Moreira


Em sua quarta visita ao Brasil, e anunciando a sua aposentadoria após 40 anos de uma carreira recheada de sucessos, a banda norte-americana Steppenwolf não decepcionou aqueles que compareceram aos concertos. No Rio, um público modesto de cerca de 600 pessoas compareceu, provavelmente devido à divulgação pouco eficiente e à falta de interesse do público em geral. Mas a agitação compensou os eventuais buracos na platéia, e a banda reconheceu e retribuiu com mais um vibrante show. Contando em sua formação com o líder, vocalista e guitarrista John Kay (ou Joachim Fritz Krauledat, como nativamente registrado na então Prússia Oriental, há 63 anos atrás), mais o guitarrista solo Danny Johnson (ex-Alice Cooper, Alcatrazz, Rod Stewart, Rick Derringer, etc.), o tecladista Michael Wilk (também webmaster do grupo) e o baterista Ron Hurst, o Steppenwolf destilou uma série de clássicos de sua várias fases, satisfazendo a todos os presentes.

Previsivelmente, os trabalhos foram abertos com “Sookie Sookie”, primeira faixa do primeiro álbum da banda (gravado em 1967 e lançado no ano seguinte), e tradicional número de abertura dos shows do Steppenwolf. O prosseguimento se deu sem muitas surpresas, sendo que, com um repertório tão extenso à disposição, Kay poderia ter ousado um pouco mais, mantendo ainda os números clássicos no repertório. Nem mesmo as estórias contadas entre as músicas (dessa feita traduzidas por um membro da produção local) mudam muito.

Musicalmente, o conjunto se mostrou tão afiado quanto nas visitas anteriores. O tecladista Michael Wilk (na banda há 25 anos) estava munido de um autêntico órgão Hammond, com sua respectiva caixa rotativa Leslie, e extraiu sonoridades sensacionais do instrumento, extremamente fiéis às versões originais. E, como se não bastasse, além de brincar com um “keytar” Korg (um daqueles teclados em formato de guitarra que tanto fizeram sucesso nos anos 80), ainda ficou a cargo da execução dos baixos, já que a banda abdicou da figura de um baixista propriamente dito desde os anos 80. No mesmo nível de excelência musical encontra-se o guitarrista Danny Johnson, o integrante mais recente do time, tendo se juntado aos companheiros há aproximadamente 10 anos. Tocando a maior parte do tempo com uma Gibson Les Paul marrom linda, Danny exibiu sua técnica impecável, com uma bagagem completa de recursos de blues, rock e jazz. É um músico muito experiente, e fornece todo o background para que John eventualmente execute seus trechos de slide guitar (uma Rickenbacker negra, lindíssima também) com total segurança, se não de forma virtuosa, pelo menos com bastante desenvoltura. Ron, o baterista, também na equipe desde os anos 80, cumpriu satisfatoriamente bem o seu papel, reproduzindo as batidas originais com precisão e discrição.

Dentre as músicas principais da época áurea da banda (oito discos lançados entre 1967 e 1972, quando encerraram as atividades pela primeira vez), foram tocadas “Snowblind Friend” (tradicional libelo antidrogas), “Hey Lawdy Mama” (uma música tocada ao vivo desde 1968, mas que, curiosamente, teve sua gravação em estúdio somente editada no álbum "Live", de 1970), “Rock Me” (do álbum “At Your Birthday Party”, de 1969), “Hoochie Coochie Man” (de Willie Dixon, gravada no primeiro disco, onde John faz sua homenagem ao blues de modo geral e a seu ídolo Muddy Waters, famoso intérprete da canção) e “Magic Carpet Ride” (do “Second”, também de 1969), um dos “hinos imortais” da psicodelia americana do final dos anos 60. A voz de John Kay, bastante preservada e com um timbre incrivelmente parecido com o de 40 anos atrás, emana uma forte carga histórica, suscitando imagens nostálgicas poderosas no público de diversas idades presente.

Outra composição de execução obrigatória, “Monster” (do álbum homônimo, de 1970, onde é creditada como “Monster/Suicide/America”), veio acompanhada do tradicional discurso “anti-establishment” (George Bush foi a vítima, pra variar). É sempre válido o artista se expressar, e John Kay é uma figura carismática e inteligente, com posições coerentes. Entretanto, seus discursos pouco acrescentam às músicas, pois as letras já possuem um conteúdo marcante, sendo muitíssimo bem escritas, concisas e com mensagens bastante claras, que falam por si só (ao contrário de muitas bandas “revolucionárias” dos anos 60/70, com textos empolados e muita confusão ideológica). É esse o caso, por exemplo, de “Move Over” (do mesmo álbum, talvez o mais “politizado” dentre os da época), também executada nessa noite.

A grande surpresa desse show em especial foi a inclusão da música "Screaming Night Hog", lançada em compacto de 1970 (um mês antes do disco "Seven"). É uma composição relativamente curta, característica de grande parte das faixas antigas da banda, mas com um riff de guitarra muito inspirado, onde John mostra um pouco da sua técnica com a gaita (presente também em um solo durante “Hoochie Coochie Man”).

Com tantas músicas para tocar em tão pouco tempo, poucas músicas mais recentes foram incluídas. Nesse aspecto, também não houve surpresas: a banda se ateve ao material do final dos anos 80, quando passaram a ser conhecidos como “John Kay & Steppenwolf”, mais precisamente dos discos “Paradox” (1984, tocaram “Tell Me It’s All Right”), “Rock’n’Roll Rebels” (de 1987, com “Hold On – Never Give Up, Never Give In” e a faixa-título) e “Rise & Shine” (de 1990, também a música-título).

Para o fechamento do show e o bis, tivemos, respectivamente, “Born to Be Wild” e “The Pusher” (antológica canção sobre drogas do músico country Hoyt Axton, gravada no primeiro disco da banda e executada ao vivo desde os tempos do Sparrow, formação pré-Steppenwolf a que John Kay veio a se integrar em 1965). Basta dizer que esse era o único fecho possível para um show e para uma carreira, exatamente o que todos estavam ali para ouvir e para celebrar.

Depois do Rio, o grupo seguiu para um show em Brasília, dois dias depois, realizado durante um festival de motociclistas, no que viria a ser a penúltima aparição ao vivo da história da banda (a derradeira apresentação teria vez um mês depois, no dia 6 de outubro de 2007, no Ripken Stadium em Aberdeen, Maryland, nos EUA). John Kay anunciou que a partir de agora irá se dedicar à fundação filantrópica de sua esposa, a “Maue Kay Foundation”. Aos fãs do Steppenwolf, restam as memórias de uma banda que permaneceu íntegra até seu fim, deixando os palcos de cabeça erguida.