quarta-feira, 7 de maio de 2008

Whitesnake – Citibank Hall – Rio de Janeiro, RJ – 07/05/2008

Texto: Rodrigo Werneck
Fotos: Henri Matthes

Quando ninguém mais esperava, eis que somente em 2008 seríamos enfim presenteados com uma apresentação completa do Whitesnake em solo brasileiro. Após os lendários concertos no Rock In Rio em 1985, e outros no Monsters of Rock há cerca de 10 anos trás e abrindo para o Judas Priest em 2005, finalmente shows de (quase) 2 horas de duração foram agendados, dentro da turnê de divulgação do novo disco de estúdio da banda, “Good To Be Bad”.

David Coverdale montou ao seu redor um time vencedor para o acompanhar em suas atuais aventuras. Sem o mesmo poder de outrora e visando um outro público e estilo, não conta mais com o luxo de ter ao seu lado medalhões como os bateristas Ian Paice, Cozy Powell (RIP), Aynsley Dunbar e Tommy Aldridge, ou os tecladistas Jon Lord e Don Airey, ou os baixistas Neil Murray, Colin Hodgkinson, Rudy Sarzo e Tony Franklin, ou ainda os guitarristas Mel Galley, Bernie Marsden, Micky Moody, Steve Vai, Vivian Campbell e John Sykes, todos ex-integrantes do grupo nesses 30 anos de sua história, e que deixaram em maior ou menor grau as suas assinaturas no estilo da banda.

Em 2002, quando Coverdale retornou com as atividades do Whitesnake em tempo integral, montou um time centrado nele próprio, mais o guitarrista Doug Aldrich (ex-Dio), que virou seu novo parceiro de composições, e ainda o segundo guitarrista Reb Beach (ex-Dokken, Alice Cooper e Winger) e o tecladista Timothy Drury (ex-Eagles e Bryan Adams), esses últimos dois contribuindo também enormemente com os vocais nos shows. Para completar o sexteto, fizeram parte inicialmente Marco Mendoza (baixo) e Tommy Aldridge (bateria), este retornando ao grupo. Tal “cozinha” já vinha se apresentando com outros grupos, como Thin Lizzy e Ted Nugent, e portanto já se juntaram em ponto de bala. Após algum tempo, porém, Mendoza deixou a banda e foi substituído pelo novato Uriah Duffy, cujo nome é uma homenagem de seus pais ao Uriah Heep (seu irmão se chama “Yes”, em outra homenagem, acreditem!). Nessa época (em 2005), vieram se apresentar no Brasil em shows de abertura para o Judas Priest, conforme mencionado anteriormente, sendo que as apresentações de 70 minutos incendiaram a platéia para o Priest, que já “pegou a bola na marca do pênalti”. Pouco tempo depois, Aldridge saiu e foi substituído por Chris Frazier (ex-Steve Vai), e essa formação foi a que veio ao Brasil dessa vez.

A boa divulgação feita pela produção dos shows proporcionou um ótimo público nessa noite de quarta-feira no Rio de Janeiro. Mais de 3.000 pessoas compareceram, sendo que nessa configuração o Citibank Hall fica extremamente confortável, com a pista cheia porém não lotada, permitindo que as pessoas se locomovam e ao mesmo tempo que se crie uma boa sensação de multidão à frente do palco, agitando a banda que se apresenta.

E, portanto, 10 minutos após as 22 horas as luzes se apagaram e a banda adentrou o palco, que estava devidamente decorado com “backdrop” e outros detalhes, fazendo com que a platéia rapidamente entrasse no clima do espetáculo. A música escolhida para a abertura, “Best Years”, não foi das melhores (ao contrário de 2005, quando começaram com “Burn”), mas como o Whitesnake está promovendo seu novo CD, era de se esperar que fossem incluir alguns números novos. Além dessa, levaram ainda as também novas “Can You Hear The Wind Blow” e “Lay Down Your Love”, todas boas músicas, mas sem serem merecedoras de maiores adjetivos. Neste ponto, um parêntese: o Whitesnake sempre foi uma banda consistente, que lançou vários discos bons, mas nunca de fato despontou como um dos grandes ícones do hard rock. Somente atingiu grande sucesso quando se sujeitou a um som mais comercial, dentro do chamado “hair metal”, embora tenha se destacado nessa época em meio à pasmaceira geral, até por contar com excelentes músicos em suas hostes.

Bem, voltando ao show, o repertório buscou satisfazer tanto aos fãs mais antigos (da época mais hard rock/rhythm’n’blues) quanto aos de gerações mais novas (já da fase mais heavy metal). Isso foi facilmente notável quando os quarentões e cinqüentões claramente curtiam músicas como “Ain't No Love In the Heart of the City” (do primeiro disco “Snakebite”, de 1978), “Here I Go Again” e “Crying In The Rain” (ambas do “Saints & Sinners”, de 1982), enquanto que o pessoal mais novo cantou junto em temas como a xaroposa “Is This Love” e as mais pesadas “Give Me All Your Love Tonight” e “Bad Boys”. Bem, na realidade todas essas cinco últimas fizeram parte, em gravações originais ou regravações, do premiado disco “1987” (também conhecido como “Whitesnake”). Já “Fool For Your Loving” satisfez a ambas “facções”, pois embora seja originalmente do disco "Ready an' Willing" (1980), foi regravada em 1989 para o álbum “Slip Of The Tongue”.

A banda atual está bastante entrosada, com a dupla de guitarristas tendo bastante destaque. Doug Aldrich assume um papel mais central, como primeiro guitarrista propriamente dito, e acabou por desenvolver um estilo um pouco “fritador” demais. É uma pena, pois ele é um excelente guitarrista e não precisa apelar para a velocidade extrema para provar isso. Basta assistir a algum DVD do Dio com ele, para ver como seu estilo se modificou nos últimos tempos. Mesmo assim, teve bons momentos, como em “Crying In The Rain”. Reb Beach tocou com mais feeling, embora seja também um guitarrista muito técnico, em alguns momentos lembrando o estilo de Steve Vai. Além disso, canta muito bem. A dupla de guitarristas levou um solo no meio do show, um dueto/duelo que emendou na instrumental “Snake Dance”, e que acabou sendo um bom momento, embora eu considere particularmente solos de uma forma geral um desperdício de tempo. E desperdício mesmo acabou sendo o solo de bateria de Chris Frazier, realmente fraco, em especial em comparação ao de Tommy Aldridge por aqui, 2 anos e meio antes (isso sem falar no de Cozy Powell no Rock In Rio, é claro). Uriah Duffy é um baixista correto, sólido, mas que não tem muito espaço para mostrar serventia, resumindo-se a bases. De qualquer forma, tem uma boa presença de palco e completa bem o time. Finalmente, Timothy Drury tem um papel de destaque porque, embora suas partes de teclados sejam secundárias (com a exceção sendo durante os temas do Deep Purple), sua voz segura a peteca em diversas partes do concerto.

Já David Coverdale demonstrou estar em forma. Claro que seu vocal não é mais o mesmo e por vezes se mostra mais “rasgado” do que antigamente, mas o fato é que ele convenceu a todos os presentes com sua boa forma, carisma e simpatia. Joga o pedestal do microfone para o alto, faz poses pseudo-eróticas, leva o público nas mãos, mas se poupa sempre que possível, seja deixando os vocais a cargo de Beach, Drury e Duffy, ou mesmo conclamando o público a cantar nos números mais conhecidos. “Love Ain’t No Stranger” foi um desses momentos, antes da qual ele homenageou seu antigo parceiro de Whitesnake, o guitarrista Mel Galley (co-autor da música), que no momento padece em casa em função de um câncer em estágio terminal. Aqui, uma curiosidade: Mel, apesar de seu estado atual, vem tentando manter o alto astral até onde possível, e recentemente recuperou sua antiga e clássica guitarra Les Paul dos tempos de Trapeze e Whitesnake, e montou um verdadeiro pub em casa, de forma que consiga permanecer a maior parte do tempo “sedado” de alguma maneira (segundo ele, “parece até o início do Whitesnake”), para melhor suportar as dores.

Outro ponto de destaque foi a versão acústica de “The Deeper The Love”,
bem no estilo do disco “Starkers In Tokyo”, somente com o vocal de Coverdale e o violão de cordas de aço de Aldrich. Assim, fica menos “comercial” que a versão com banda integral, e cria um clima intimista com a platéia. Clima esse que aumentou ainda mais na versão a cappella de “Soldier of Fortune”, do Deep Purple, que David levou sozinho no palco logo após o petardo “Still of The Night”, já no bis. Embora a voz deixe um pouco a desejar nessa hora, mesmo assim ficou legal e o público adorou. O risco corrido valeu a pena, pois todos estavam afeitos à idéia de dar um desconto a eventuais (pequenas) falhas na voz.

Para fechar a noite, nada melhor do que a já tradicional versão de “Burn”, com “Stormbringer” jogada a seu meio (ambas do Deep Purple). Nesse momento, três coisas ficaram claras: a superioridade do Purple em termos de composição, em comparação ao Whitesnake, exigindo muito mais de todos da banda; a evidência de que a “fritação guitarrística” não se aplica a solos classudos como os de Ritchie Blackmore; e a constatação de que não é qualquer um que toca as partes originais de Ian Paice na bateria (Frazier se saiu bem no show todo, mas aqui deixou a desejar, sem conseguir emular as viradas que “infestam” a canção em seu arranjo original). Mesmo assim, foi uma ótima escolha para fazer com que o público saísse com sabor de satisfação, e ansiando por um breve retorno.

Setlist:

- Best Years
- Fool For Your Loving
- Bad Boys
- Can You Hear The Wind Blow
- Love Ain't No Stranger
- Lay Down Your Love
- Is This Love
- Guitar solo / Snake Dance
- Crying In The Rain (incl. drum solo)
- Ain't No Love In the Heart of the City
- The Deeper The Love
- Give Me All Your Love Tonight
- Here I Go Again

Bis:
- Still Of The Night
- Soldier Of Fortune
- Burn/Stormbringer